Cristina Real nasceu em 1989, em Lisboa, e
em 2009 rumou ao Porto para estudar Design de Moda. Na plataforma Sangue Novo
vai apresentar “Interrupção”, uma colecção resultante de “uma paragem, de um
momento em que começamos a reflectir sobre quem somos, o que queremos fazer e
qual é a nossa referência”.
Qual é a primeira recordação de moda que
tens?
A minha mãe
fez um curso de alta-costura em Paris quando era mais nova... Ela não exerce
porque, afinal, não gosta e eu acabei por seguir o caminho dela. Foi um bocado
estranho. As minhas primeiras recordações de moda vêm da minha mãe. Aliás, esta
colecção vem um bocadinho dela. Quando estava a preparar as ilustrações, fiz o
rosto e pensei “parece-me a minha mãe”...
Qual é o conceito desta colecção?
O conceito é
um bocadinho abstracto. Surge a partir de uma mente em branco, do vazio, em que
tudo acontece através de um ponto, que se transforma em linha até chegar à
forma. O que é interessante neste conceito é não haver uma obrigação, é a
liberdade... a liberdade da linha, da forma, da expressão, do pensamento, da
criatividade. É não haver nenhuma imagem.
O conceito é
muito, muito importante para mim. É preciso explorar até à exaustão para que as
coisas surjam e evoluam.
Neste caso, é um conceito bastante
abstracto, não há uma inspiração clara, marcada...
Ver uma
colecção em que o conceito é muito evidente ou em que se sabe qual foi a
inspiração pode levar as pessoas a ficarem só com aquilo. Eu acho interessante
quando as pessoas vêem a colecção e tentam perceber o que aconteceu, como é que
eu cheguei ali... Gosto quando tentam perceber a minha linha de raciocínio e chegar
a outros caminhos. É importante não haver uma paragem, é realmente importante a
pessoa tentar conectar-se com aquilo e tentar perceber.
O papel da moda é esse? É fazer com que as
pessoas pensem?
Completamente!
Quando uma pessoa vai a uma galeria e vê um quadro... Passam por ali imensas
pessoas e cada uma teve uma ideia diferente e às vezes nem chegam a ter a mesma
ideia do autor. E é isso que é importante: dar continuidade a algo que já
existe, explorar essa forma. É isso que eu quero dar a entender com esta
colecção.
O que te fascina na moda?
A moda pode
envolver qualquer outra coisa. Na moda, podemos inspirar-nos na pintura, na
arquitectura, em tudo. Foi isso que me cativou ainda mais: através de uma
simples roupa, podemos ir buscar todos aqueles elementos que nos fascinam.
Esta
colecção adapta-se a qualquer pessoa, a qualquer estilo. Para mim, as colecções
não têm que ter uma faixa etária como alvo. As pessoas têm que sentir-se
livres. Não interessa o estilo da pessoa, a colecção adapta-se a qualquer indivíduo.
Não tens um público em mente quando crias?
Não existe
limite. Esta colecção foi feita a pensar no mundo. Ela é livre... Foi pensada
em tantas pessoas, em tantos povos, em tantas culturas que acaba por ser um
ponto de união.
Actualmente,
a moda atrai todos os públicos. Por que não pensar em todos? Por que havemos de
ter um público-alvo? O importante nas minhas peças são os detalhes, não a peça
em si.
Teres uma marca própria seria a forma de
poderes explorar essa liberdade?
Eu gostava
de ter uma marca, mas sinto que tenho que aprender mais. Sinto que tenho muito
para aprender... Apresentar uma, duas ou até cinco colecções não é o essencial,
não com a minha idade...
A nossa geração tem muita pressa. Nós temos
pressa de fazer com que as coisas aconteçam, de chegar às coisas...
Porque está
tudo muito rápido!
E tu tens exactamente o processo oposto...
Eu não tenho
pressa. Eu faço as coisas com calma. A minha oportunidade surgiu agora, dois
anos depois de acabar o curso. Esse tempo foi importante, fez-me conhecer
pessoas, reflectir. Por que é que tem que ser já? Tudo acontece já...
Claro que temos que estar preparados para entrar, caso haja uma oportunidade.
Se uma porta se abre, não podemos ficar ali a pensar...
A ModaLisboa é uma porta que se abriu?
É uma porta
que se abriu e eu entrei! Ser aceite na ModaLisboa é um voto de confiança. É
agarrá-lo e ir, dar 100% de nós. E é não ter medo, não ter medo de falhar, não
ter medo da reacção das pessoas. As opiniões são muito importantes. É
importante ouvir “não” ou ouvir “eu não gosto”. Principalmente numa fase em que
estou a começar porque são essas pessoas que me dão força e me fazem pensar.
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Cristina Real was born in 1989, in Lisbon. In 2009, she moved to Porto
to study Fashion Design. “Interrupção” [Interruption] is the collection that she will be
presenting at Sangue Novo, a collection that results from “a stop, a moment in
which we start to reflect about who we are, what we want, what we want to do
and what our reference is”.
What’s your earliest memory of fashion?
My mother took an Haute Couture course in Paris when she
was younger… She doesn’t work in fashion because, after all, she doesn’t like
it that much but I ended up following that path. It’s a little weird... My
first memories of fashion come from my mother. Actually, this collection comes partially
from her. When I was preparing the illustrations, I drew the face and thought
“it looks like my mum”…
What’s the concept of this collection?
The concept is a little bit
abstract. It comes from a blank mind, the emptiness, where everything starts
from a point, which will transform into a line until it reaches its ultimate
shape. The interesting part about this concept is that there is no obligation,
there’s only freedom… the line, the shape, the expression, the thought, the
creativity, they are all free. It’s interesting that there isn’t one specific
image.
The concept is very, vey important
to me. It needs to be explored to the very limit in order for things to come up
and evolve.
In this case, your concept is very broad, there isn’t a clear
inspiration…
Seeing a collection whose concept or
inspiration is clearly evident may lead people to conform. I find it
interesting when people see a collection and try to understand what happened,
how I got to that point. I like it when people try to understand the way I
think and get to other paths. It’s important when there are no stops, it’s
really important that people try to connect with what they are seeing and
understand it.
Is that the role of fashion? To make people think?
Totally! When someone goes to a
gallery and sees a painting… Many people take a look at it and each one of them
may have a different idea about it, and it may not coincide with the actual
painter’s idea. That’s the important part: to give things continuity, explore
the shape. That’s what I want to transmit with this collection.
What is it that fascinates you about fashion?
Fashion may involve anything. In
fashion, we can get inspiration from paintings, from architecture, from
everything. That’s what fascinated me the most: through a simple piece, we can
bring together all the elements that fascinate us.
This collection is for everyone, for
every style. For me, collections don’t need to have a target, a specific
audience. It’s not about someone’s style because this collection adapts to
everyone.
Don’t you have a specific person in mind when designing?
There are no limits. This collection
comes from the world. It’s a free collection… It was inspired by so many people
and so many cultures that it ends up being a meeting point.
Right now, fashion attracts all
sorts of audience. Why not think of everyone? Why should we have a specific
target in mind? The important thing in my collections is the details, not the
piece itself.
Having your own brand would be the way to explore that freedom?
I would like to have my own brand,
but I feel that I need to learn more. I feel there’s a lot more for me to
learn… Presenting one, two or even five collections is not the most important
thing, not at this age.
Our generation lives life in a hurry. We want to make things happen very
quickly, achieve our goals immediately…
Because everything happens really
quickly nowadays!
But you have the exact opposite process…
I don’t live in a hurry. I do things
calmly. I had my opportunity now, two years after graduating. That period of
time was important, as it allowed me to meet people, to reflect. Why does
everything have to happen now? Everything happens now… However, we need to be ready to take advantage of it, if we
have an opportunity. If there’s a door of opportunity, we can’t just stand
there thinking…
Was that what happened with ModaLisboa?
The opportunity knocked at the door
and I opened it! This is a vote of confidence. I need to take this opportunity
and make the most out of it. And not be afraid, not be afraid of failing, of
people’s reaction. Opinions are very important. It’s important to hear “no” or
“I don’t like it”. Especially because I am just starting and that’s what keeps
me going and makes me think.